sábado, 11 de agosto de 2018

As Disciplinas Espirituais


As Disciplinas Espirituais
Gl.5.16-26; 6.7,8                 
Pb Francisco -  Escola Bíblica Dominical IPB Emaús – 29/07/2018

Introdução
No ultimo domingo, pela manhã falamos sobre 4 características singulares e fundamentais para compreensão do que é o Reino de Deus, e o quanto e como essa compreensão deve dirigir nosso modo de viver (o texto em que nos baseamos foi Romanos 14). À noite falamos sobre a experiência de Davi em sua relação com o Sumo Pastor (Salmo 23), e há ali uma amostra de 2 caminhos:
  •              O andar pelo caminho elevado das “veredas da justiça”, sob a obediência do Sumo Pastor.
  •           O andar no “vale da sombra e da morte” pelas nossas próprias decisões.
Em João 10, Jesus se identifica como o Bom Pastor (Sl23), a quem as ovelhas conhecem a voz e seguem. Pois bem, agora a questão é de que forma prática podemos viver e expressar essas realidades? Nesse ponto, sempre nos deparamos com um dilema:
·         Justiça, como dom gratuito de Deus, imputada a nós.
Vrs.
·         Esforço humano,que sempre acaba em falência moral.

O que fazer ?
Se os esforços humanos terminam em falência moral (e tendo-o tentado, sabemos que é assim), e se a justiça é um dom gratuito de Deus (conforme a Bíblia nos mostra com clareza), então não é lógico deduzir que devemos esperar que Deus venha e nos transforme? Por estranho que pareça, a resposta é “não”. A análise é correta: o esforço humano é insuficiente e a justiça é o dom de Deus. O que é falha é a conclusão, pois felizmente existe algo que podemos fazer. Não precisamos agarrar-nos às pontas do dilema das obras nem da ociosidade humanas.
Deus nos deu as Disciplinas da vida espiritual como meio de receber sua graça.
As Disciplinas permitem-nos colocar-nos diante de Deus de sorte que ele possa transformar-nos.
O apóstolo Paulo disse: “O que semeia para a sua própria carne, da carne colherá corrupção; mas o que semeia para o Espírito, do Espírito colherá vida eterna” (Gálatas 6:8). O lavrador não consegue fazer germinar o grão; tudo o que ele pode fazer é prover as condições certas para o crescimento do grão.
Ele lança a semente na terra onde as forças naturais assumem o controle e fazem surgir o grão. O mesmo acontece com as Disciplinas Espirituais - elas são um meio de semear para o Espírito. As Disciplinas são o meio de Deus plantar-nos na terra; elas nos colocam onde ele possa trabalhar dentro de nós e transformar-nos. Sozinhas, as Disciplinas Espirituais nada podem fazer; elas só podem colocar-nos no lugar onde algo possa ser feito. Elas são os meios de graça de Deus. A justiça interior que buscamos não é algo que seja derramado sobre nossas cabeças. Deus ordenou as Disciplinas da vida espiritual como meios pelos quais somos colocados onde ele pode abençoar-nos. (A Celebração da Discilplina, Richard Foster)
Conforme o trecho em destaque acima, o dilema proposto inicialmente é uma invenção nossa. Deus, em sua infinita bondade e sabedoria, nos deu disciplinas espirituais como meios de graça. Não devemos, portanto, nos assentar comodamente no mote “a salvação é pela graça e não por obras” e viver uma vida inteiramente ociosa.
Deus nos deu disciplinas como meios de Graça

O propósito dessas disciplinas é transformação de nossas vidas de dentro para fora, e assim nos fazer verdadeiros cidadãos do Reino de Deus, verdadeiras ovelhas do rebanho de Sumo Pastor.
Não devemos ser levados a crer que as Disciplinas são para os gigantes espirituais e, por isso, estejam além de nosso alcance; ou para os contemplativos que devotam todo o tempo à oração e à meditação. Longe disso.
Na intenção de Deus, as Disciplinas da vida espiritual são para seres humanos comuns: pessoas que têm empregos, que cuidam dos filhos, que lavam pratos e cortam grama. Na realidade, as Disciplinas são mais bem exercidas no meio de nossas atividades normais diárias. Se elas devem ter qualquer efeito transformador, o efeito deve encontrar-se nas conjunturas comuns da vida humana: em nossos relacionamentos com o marido ou com a esposa, com nossos irmãos e irmãs, ou com nossos amigos e vizinhos. Nem deveríamos pensar nas Disciplinas Espirituais como uma tarefa ingrata e monótona que visa a exterminar o riso da face da terra. Alegria é nota dominante de todas as Disciplinas. O objetivo das Disciplinas é o livramento da sufocante escravidão ao auto-interesse e ao medo. Quando a disposição interior de alguém é libertada de tudo quanto o subjuga, dificilmente se pode descrever essa situação como tarefa ingrata e monótona. Cantar, dançar, até mesmo gritar, caracterizam as Disciplinas da vida espiritual. (Richard Foster)
Vamos descrever brevemente aqui, algumas dessas disciplinas. Talvez, os nomes nos sejam familiares, mas a prática e o exercício dessas disciplinas não sejam tão claros assim. Que o Senhor nos ajude a compreende-las corretamente, e sobretudo que sintamos motivação e satisfação em praticá-las.

1.     Disciplina da Oração

Oração é mudar. Podemos dizer que oração é o meio de Graça de Deus, que visa transformar a nossa vida. Geralmente pensamos na oração como meio de mudar as coisas à nossa volta, mudar circunstâncias adversas, trazer paz e comodidade para nossa vida. Esses motivos não estão errados, mas o propósito primordial da oração é mudar a nós mesmos. “A oração - a oração secreta, fervorosa, de fé - jaz à raiz de toda piedade pessoal”, escreve William Carey.  Se não estivermos dispostos a mudar abandonaremos a oração. As coisas/situações que nos causam ansiedade podem e devem ser colocadas diante de Deus através da oração, e não há nenhum problema em pedir que Deus aja mudando essas situações. Mas veja, quando Paulo nos ensinou essa prática (Fp.4.6,7) ele não deu a solução do que está nos afligindo como resultado dessa oração, mas uma mudança na nossa mente e coração. Mas é bom salientarmos: “É fácil sermos derrotados logo de início por nos haverem ensinado que tudo no universo já foi determinado, e assim as coisas não podem ser mudadas. Podemos melancolicamente sentir-nos desse modo, mas não é isso o que a Bíblia ensina.
Os suplicantes que encontramos na Bíblia agiam como se suas orações pudessem fazer e fizessem uma diferença objetiva. O apóstolo Paulo alegremente anunciou que “somos cooperadores de Deus” (1 Coríntios 3.9); isto é, estamos trabalhando com Deus para determinar o resultado dos acontecimentos. O estoicismo, e não a Bíblia, é que exige um universo fechado. Muitos, com sua ênfase sobre aquiescência e resignação ao modo de ser das coisas como “a vontade de Deus”, aproximam-se mais de Epícteto que de Cristo. Moisés foi ousado na oração porque acreditava poder mudar as coisas, e mudar até mesmo a mente de Deus. De fato, a Bíblia de tal modo acentua a abertura de nosso universo que, num antropomorfismo duro para os ouvintes modernos, ela fala que Deus constantemente muda de idéia de acordo com seu amor imutável (Êxodo 32.14; Jonas 3.10).
Outro ponto importante a ser destacado nas práticas da disciplina da oração é a  oração secreta. Qualquer prática das disciplinas espirituais é terrível, quando transformadas por nós em lei que nos aprisionam a uma exibição meramente externa. Jesus nos ensinou isso nos evangelhos: “E, quando orardes, não sereis como os hipócritas; porque gostam de orar em pé nas sinagogas e nos cantos das praças, para serem vistos dos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa. Tu, porém, quando orares, entra nos teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.” (Mt. 6.5,6). Com isso evidentemente, não estamos dizendo que haja qualquer problema nas reuniões de oração, mas salientando o ensino de que devemos desenvolver uma prática de oração particular, onde temos uma maior liberdade para expor nossas vidas diante de Deus.
Aprendendo a Orar
A verdadeira oração é algo que aprendemos. Os discípulos pediram a Jesus:
“Senhor, ensina-nos a orar” (Lucas 11.1). Eles haviam orado a vida toda, não obstante, algo acerca da qualidade e quantidade da oração de Jesus levou-os a ver quão pouco sabiam a respeito da oração. Se a oração deles havia de produzir alguma diferença no cenário humano, era preciso que eles aprendessem algumas coisas.
Uma das experiências libertadoras em minha vida aconteceu quando entendi que a oração implicava um processo de aprendizado. Senti-me livre para indagar, para experimentar, até mesmo para falhar, pois eu sabia que estava aprendendo. (Richard Foster)
 

2.     Disciplina do Jejum

O Jejum na Bíblia
“Nas Escrituras o jejum refere-se à abstenção de alimento para finalidades espirituais. Ele se distingue da greve de fome, cujo propósito é adquirir poder político ou atrair a atenção abstinência de alimento, mas para propósitos físicos e não espirituais. Devido à secularização da sociedade moderna, o “jejum” (se de algum modo praticado) é motivado ou por vaidade ou pelo desejo de poder. Isto não quer dizer que essas formas de “jejum” sejam necessariamente erradas, mas que seu objetivo difere do jejum descrito nas Escrituras. O jejum bíblico sempre se concentra em finalidades espirituais.” R. Foster, p.41
O jejum é uma prática esquecida e desacreditada no nosso tempo, mas poderíamos listar uma série interminável de homens na Bíblia e ao longo da história que praticaram e ensinaram sobre. Um excelente trecho bíblico que ensina sobre o Jejum está lá no profeta Isaías capítulo 58, de onde pode destacar brevemente alguns pontos aqui:
·         O jejum, não tem como propósito atender os nossos caprichos, e nos conceder conforto e tranqüilidade. Mas como já dissemos as disciplinas espirituais visam primordial mudar a nós mesmos. Is.58.1-3
·         O jejum, não é pura e simples abstinência de alimento, mas deve ser acompanhada de um esforço para viver vida santa nas nossas práticas e relações. Is.58.5-7
·         O jejum é ainda um meio de nos aproximar mais de Deus, de forma que Ele seja bem percebido por nós em todos os nossos caminhos. Is.58.8-11
·         O jejum é também um meio por excelência de alimentar nossa alma, e abençoar nossa posteridade. Is.58.11-12
·         Essa prática nos livrará ainda de vivermos em função dos próprios interesses. Is.58.13-14.

3.     Disciplina da Simplicidade

Como todas as disciplinas espirituais ensinadas nas Escrituras, a vida simples é uma realidade interior que se faz perceber no exterior.
“Quando vivemos verdadeiramente na simplicidade interior, toda a nossa aparência é mais franca, mais natural. A verdadeira simplicidade... faz-nos cônscios de certa abertura, moderação, inocência, alegria e serenidade, o que é encantador quando o vemos de perto e continuamente, com olhos puros. Oh, quão amável é esta simplicidade! Quem ma dará? Por ela deixo tudo. Ela é a pérola do Evangelho.” - François Fénelon
Vivemos em uma época em que a simplicidade definitivamente não é reconhecida como uma virtude. Em geral, as pessoas do nosso tempo são motivadas por modas, títulos, ostentação ou buscas por adquirir coisas para impressionar. E é óbvio que quando vivemos com essas motivações perdemos contato com a simplicidade cristã, simplicidade do Evangelho. Somos afligidos por necessidades impostas pelo mundo
“Falta à cultura contemporânea tanto a realidade interior como o estilo de vida de simplicidade exterior. Internamente o homem moderno está fraturado e fragmentado. Encontra-se perdido num labirinto de realizações competidoras. Num momento ele toma decisões com base na razão sadia, e no momento seguinte o faz por medo do que os outros venham a pensar dele. Ele não tem unidade ou foco em torno do qual a vida se oriente. Pelo fato de faltar-nos um Centro divino, nossa necessidade de segurança tem-nos induzido a um apego insano às coisas. Devemos entender com clareza que o ardente desejo de abundância na sociedade contemporânea é de natureza psicótica. É psicótica porque perdeu por completo o contato com a realidade.” (Foster, p.65)
Mas, vejamos o caminho que as Escrituras nos ensinam como estilo de vida:
“Aprendi a viver contente em toda e qualquer situação. Tanto sei estar humilhado como também ser honrado; de tudo, e em todas as circunstancias, já tenho experiência, tanto de fartura como de fome; assim de abundancia como de escassez; tudo posso naquele que me fortalece.” Fp.4.11-13
Podemos destacar algo nesse trecho:
  •       Primeiro Paulo nos mostra que essa simplicidade foi aprendida (v.11)
  •          Podemos também inferir, que essa prática é libertadora, pois Paulo não tem necessidade de demonstrar algo em sua vida que não seja a realidade que ele está vivendo no momento.
  •          Quem o fortalece é Cristo, e não algum bem, ou alguma coisa externa.(v.13)
“Se alguém ensina outra doutrina e não concorda com as sãs palavras de nosso Senhor Jesus Cristo e com o ensino segundo a piedade, é enfatuado, nada entende, mas tem mania por questões e contendas de palavras, de que nascem inveja, provocação, difamações, suspeitas malignas, altercações sem fim, por homens cuja mente é pervertida e privados da verdade, supondo que a piedade é fonte de lucro. De fato, grande fonte de lucro é a piedade com o contentamento.  Porque nada temos trazido para o mundo, nem coisa alguma podemos levar dele.  Tendo sustento e com que nos vestir, estejamos contentes.” 1Tm.6.3-8

·         “Enfatuado” é vaidoso e vazio, alguém que buscas as coisas mais vazias dessa vida e as confundem como sendo o objetivo da vida cristã nos abastecer de bens materiais, de onde só nascem inveja, provocação, difamações, disputas (altercações)
·         A piedade só é real e tem valor quando vem acompanhada de contentamento.
·         A vida simples ensinada pelo Evangelho é uma vida livre dos valores desse mundo (Mt.6.19-210
·         O contentamento é a verdadeira marca de uma ovelha do supremo Pastor, e do cidadão do Reino de Deus.

“Seja a vossa vida sem avareza. Contentai-vos com as coisas que tendes; porque ele tem dito: De maneira alguma te deixarei, nunca jamais te abandonarei.” Hb.13.5

·         Uma vida simples, liberta da avareza, é uma vida marcada pelo contentamento, e, sobretudo uma vida que repousa tranquilamente na provisão de Deus.

A simplicidade é a única coisa que pode adequadamente reorientar nossas vidas de sorte que as posses sejam autenticamente desfrutadas sem destruir-nos. Sem a simplicidade, ou capitularemos ao espírito de “Mamom” da presente era má, ou cairemos num ascetismo legalista e anticristão. Ambas as situações levam à idolatria. Ambas são espiritualmente fatais. Foster, p.69

Há ainda uma série de outras Disciplinas Espirituais, que poderemos falar em outra oportunidade. Deixamos aqui algumas delas com breves definições e observações extraídas do livro Celebração da Disciplina (Richard Foster, editora Vida). Recomendamos a leitura e estudo desse livro para um maior aprofundamento nessas disciplinas.        

4.     Disciplina do Estudo

“Quem estuda somente os homens, adquire o corpo do conhecimento sem a alma; e quem estuda somente os livros, a alma sem o corpo. Quem adiciona a observação àquilo que vê, e reflexão àquilo que lê, está no caminho certo do conhecimento, contanto que ao sondar os corações dos outros, não negligencie o seu próprio.” - Caleb Colton

·         Estudo é um tipo específico de experiência em que, mediante cuidadosa observação de estruturas objetivas, levamos os processos de pensamento a moverem-se numa determinada direção.
·         No estudo há dois “livros” a serem estudados: verbal e não verbal. Livros e preleções constituem, portanto, apenas metade do campo de estudo, talvez menos.
·         O mundo da natureza e, muitíssimo importante, a observação cuidadosa dos acontecimentos e das ações são os campos básicos do estudo não verbal.

5.     Disciplina da Confissão

“A confissão de obras más é o primeiro começo de obras boas.” - Agostinho de Hipona                           
·         “Mas não é a confissão uma graça em vez de uma Disciplina?” Ela é ambas. A menos que Deus conceda a graça, não há confissão autêntica. Mas é também uma Disciplina, porque há coisas que devemos fazer. É um curso de ação conscientemente escolhido que nos conduz à sombra do Todo-poderoso.
·         Achamos a confissão uma Disciplina tão difícil em parte porque vivemos a comunidade dos crentes com uma comunhão de santos antes de vê-la como uma comunhão de pecadores.
·         Na Disciplina da confissão pedimos a Deus que nos dê um ardente desejo de viver santamente, e um ódio pela vida ímpia.
Há ainda,

6.     Disciplina da Solitude 

7.     Disciplina da Adoração

8.     Disciplina da Celebração


Que o Senhor nos conduza  pelos caminhos das santas disciplinas, conscientes de que essas disciplinas é que nos livrarão da escravidão de hábitos arraigados em nós. Que Ele nos faça humildes para aprender dEle sabendo que acolhe todos os “que estão cansados, e sobrecarregados” e encontraremos nisso “descanso para nossa alma”, pois as Disciplinas Espirituais são Seu “Jugo suave, e fardo leve”.

BIBLIOGRAFIA

BIBLIA, Almeida Revista e Atualizada

FOSTER, Richard J. Celebração da Disciplina:O Caminho do Crescimento Espiritual. São Paulo. Editora Vida, 2007




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